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sexta-feira, 25 de março de 2011

2a Carta ao meu amor

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Carta ao meu amor

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Sobre amantes e amigos

Há no relógio das relações humanas dois sentimentos que, embora distintos etimologicamente, coexistem num mesmo momento. Falo do amor e da amizade; ou de amantes e amigos. E por que duas palavras de origem tão diferentes e significados próprios parecem ser uma coisa só?
Amigo não é colega. Amigo é, antes de qualquer coisa, quem gostaríamos de ser. Alguém que nos preenche, nos completa, nos diz as coisas que precisamos ouvir. Amigo compartilha. Amigo doa. Amigo estende os braços a qualquer hora, em qualquer tempo. Amigo está presente mesmo estando ausente. Amigo ocupa o melhor cômodo do coração. Amigo é fiel. Amigo é para sempre. Amigo não é pai e não é irmão; mas pai e irmão podem ser amigos. Amigos, muitas vezes, são mais do que pais e irmãos. Amigos são nossos melhores amantes.
Amante não é um estranho. Amante é, antes de tudo, quem escolhemos para estar. Alguém que nos acolhe, nos repara, nos diz coisas aos ouvidos que nos fazem viajar. Amante reparte. Amante nos acalenta com seu corpo, nos perfuma com seu cheiro, nos possui e se deixa possuir. Amante nunca está ausente, pois que o trazemos impregnado em nossa alma e corpo. Amante ocupa todos os cômodos do coração. Amante pretende ser fiel. Amante deveria ser para sempre. Amante não é parente. Embora o laço que o amarra a nós possa ser de sangue. Amantes, muitas vezes, são tudo o que temos. Amantes são nossos amigos mais próximos.
Esses dois sentimentos, amor e amizade, são inseparáveis. Quando um morre, o outro morre também. Por acaso é possível sobreviver a amizade, digo a amizade original, após o fim de um amor? De outra maneira, é possível se ter amor por alguém que não estimamos mais? Ainda nos preenche como amigo alguém que não é mais amante? Queremos como amantes a alguém que não escolhemos estar?
Amigos podem ser amantes? No que tange a sexo, é uma possibilidade... Mas só dormimos com nossos amantes porque são nossos amigos. Alguém dormiria, de bom grado, com um inimigo? A amizade nasce primeiro porque é filha da empatia que, por sua vez, alimenta o amor. Mas de qual amor falamos? Amantes fazem amor porque o sentem. Amigos sentem o amor porque são igualmente amados, por isso, amantes.
E quando nos invade uma vontade descomunal de dormir com alguém que repartimos, até ali, só amizade? A resposta está em outra pergunta: Queremos fazer amor ou sexo? Amantes fazem amor. Amigos fazem sexo. Se queremos fazer amor é porque a amizade já não cabe sozinha na relação, sejamos amantes. Se for sexo o que queremos, melhor ainda que seja com um amigo, não é mesmo?
De um jeito ou de outro, amemos. Existe uma imensa possibilidade de não ser em vão.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Em uma noite do ano de 2006, um amigo que atendia pela alcunha de "Mosquito" (por onde você anda, inseto?) veio com o embrião daquele que seria o primeiro movimento poético da Faculdade de Letras da UERJ em muitos anos: O TUdiSmo! Bem, foram alguns saraus, muita empolgação, aprovações calorosas, mas muito pouca divulgação. Estávamos para concluir o curso e as atribuições inerentes a todo fim de curso nos limitava. Deixamos passar, talvez, a chance de, assim como os modernistas de 22, lançar aos olhos de nossa literatura uma nova proposta.

Mas o que é o TuDismO?

Abaixo o Manifesto Tudista escrito por mim e parte das poesias tudistas que escrevi. Lamentavelmente, não fiquei com nada escrito pelo Mosquito e por outros que se engajaram...

O manifesto Tudista

(h)ora se inicia (ou se termina)
O que no plano do palco das in-dimensões
Nomearemos de Tudismo.
Tudismo é nada com tudo dentro.
È um contentamento descontente
Que bate n’água e respinga na bunda
Da gente.
Tudismo é a água, é a bunda e não é agente.
Tudismo é o monstro do armário e é a criança
Que gargalha excitada de medo.
Tudismo é o armário e o oco dentro.
Tudismo é a praia que não se vê diante dela
É o mar que se toca no deserto Hún mido.
Tudismo é a contra-mão da contra-mão do ir e vir contínuo.
É o homem e a mulher que não vingaram
Mas que se roçam nos buracos fundos dos ranchos
Bem pra lá do fim do mundo.
È o fim do mundo pelo começo.
É o começo que não se inicia.
É a poesia que não se entende
Porque entender é burrificar
A capacidade humana de se alienar.
Tudismo é um grito sem voz.
Tudismo é o soco no estomago,
Mas não é a dor demandada,
Pois que a dor pede continuidade
Na mazela do sofrimento Un mano
E o tudismo não é humano
É antes, cósmico no sentido palpável
É a estrela que se pega e o sol que não queima
A lua que não se pisa e o céu que rasga
Não sendo de brigadeiro.
È o poeta fingidor falando verdades.
É a im-verdade contida na lágrima
Que cai da boca e atinge, doce, os olhos.
Tudismo é o sexo não-feito com orgasmo pleno.
É o barco na estação de trem e é o trem
Esperando um neném.
Blém! Blém! Blém!
É Belém! Não, não é.
É Belém! Sim, pois é.
Tudismo é o sangue Hazul-vermelhado
Que pinga do telhado das veias dos
Gatos pardos e das gatas em teto
De zinco quente.
Tudismo é a gente. Agente. Há gente. À gente. Des-ter-gente.
É a desconstrução sem querer desconstruir
Mas já querendo desconstru-ar.
É voar. Viar. Vear. Vuar. Vá-ar.
Tudismo é tudo o que não cabe dentro.
Não pelo tamanho, mas pela forma.
Não pela geometria, mas pela filosofia.
Não pelo blá, blá, blá, mas pelo nada.
A forma do nada com nada dentro
Ou tudo fora.
O ponteiro gozado da sem-hora.
O pinto molhado do semvergonha.
O molhado seco do espesso vácuo do tempo.
O Tudismo nasce morto. Nati-vivo.
Não que não respire, mas antes é mofo.
Missa de déssimo-cético dia
Orada as vinte e sete horas e setenta e treiz minuetos.
É o pum dos críticos de artes
Que esvaziam-se com a delicadeza de uma gazela
Estuprada pelo Bambi.
Tudo é Tudismo e o tudo não é nada.
E nada é imaginar o que seria ser tudo.
Tudismo é a des-regra de vinte e oito dias.
É a des-graça dos entendidos ignorantes.
Tudismo é por fim e por definição
Todo o léxico numa caixa de fósforos
Que não acendem por discordarem
Do aperto que passam e aí explodem
Pela combustão de suas en (es)tranhas
Re-xeadas de çoberba.


Obituário do autor: Senhores, o Tudismo não é nada disto tudo. É muito mais ainda.


O cor- pûs Zumano

As zunha quebradas dó-em.
Os zouvidos zumbem zunindo inflamados.
Os zólhos ardem com a pimenta dos-houtros.
As zorelhas gotejam a cera podre das zabelhas mortas.
Os zossos estalam velhos e desconformes.
Os zovos já não fabricam, putrificam abraçados.
Os zílios carregam no telhado o pó dos ácaros.
ZzzzzzzzzZzzzzzzzzzzzZzzzzzzzzzzZzzzzzzz!
O zumbigo zinzinvolve um zodamoinho sujo.
As zélulas murxam zem se falar.
As zitocôndria (que que é que é isso?) zitocondreiam 100 directv.
nOs zútero já não cabem tanto ka-brito (Pelé Garrincha?)
O zóvario já cospe sêmem e vomita çangre.
A Zuleika. Ah, a Zuleika e suas pernas que não podemos ver.
Como seriam as pernas da Zuleika?
Os zoelhos seriam gordos ou perfurados?
E os zeniscos? Futebol ou feijoada?
A Zola dos pies. Caminhos de ratos in-esgotáveis.
O zu á parte mais dolorida,
É a entrada e a saída da zaliva.
A zozota ta carcomida pela falta D.
E eu aqui ziguezagueio tudo,
Sem nada dentro.
Dentro-fora. Fora-dentro.
Mas aí, como gostoso dói.
Ai, o vento e o em-si-mento!


Som-neto da Hermicéia da Anunciapção

Oh lídicestuosa muliér de armento
Que na dogbiase plende o paluncro
Cordifixa obtume do fódico buncro
A catética catalumia do palarciento.

Aquicestrosa massífera pergaminhoca
Hermicéia abilvere de tam vagenho
De algodozar junéstico tilengenho
Quedam las píderas sam estrepilhoca.

Gibaniste aguadame lo paragodão
Já que vume se dá ao fumeríndor
Capistraneiam sem vél o hermigrão.

Oh, simitrica portesa de dormidor
Jacatarda na loditarde de Urdião.
Bomeríade de rifo a sae de polor.


T= N-T.xy.(h-8) + 4x

Ai as phórmulas
Assim estampadas no papel
Parecem sereias querendo secço.
E a hipocrisia dos comprimidos para dormir
Não merecem minha atenção.
Co-respondo a gula fálica
E vou me deitar-me antes que
O matemático re-invente a pólvora.

Tudonudismo

Uma mulier comendo romã tira a roupa rota do rei de Roma e rema rio a-rriba roendo a ratoeira do rato roxo que de raiva da rapariga ranheta arranha a aranha dela e... acabou-se a ridi-cu-lá ristória.


Amorrrrrr que?

Me passa a escova?
Tá quente.
Não, a escova!
Cadê o ferro?
Te amo!
Me passa a pasta?
Tá seca.
Não, a pasta dentifrícia!
O tubo é de prástico.
Te amo!
Me passa a tua boca
Qué não!
Não te amo mais.
Tap!


Som – neto matemáticuzinho

Um mil novecentos e deiz
Quatro centos e quarenta e seis
Mil novecentos e vinte e treis
Quarenta e quatro mil réis.

Trezentos e quinze dezenas
Mil duzentas e mais cinqüenta
Três milhões e menos sessenta
Setenta mil e cinco centenas.

Onze! Mil e quinhentos avos
Seis mil e duzentos milhões
Uma centena de dois centavos

Oitenta e cinco mil bilhões
Sete centos de três dollavos
Novecentas dúzias de anões.


O cuspe

Na parcimônia ensopada de tua boca
Entre o prisma anasalado de tuas coxas
Descanso meu ganso tragi-cônego.
Ah, quanto hálito in-fronhado
Na brancura negresca da tua trama
Ai minha cama! Ai minha cama!
Que não se quebra com tão empenho.
Oh doce ensopado que não tenho.

(um abutre ia passando na lama in-cardíaca de meus olhos e deixou-me a conta seca das (h)oras mortas para que à noitinha, quando o verme vier roer-me os ossos, tu possas dizer do amor que teve: que não se findou posto que é grama, mas que seja etéreo enquanto espume.)

Cripta crepuscular dos bondes d’alma
Leva para além de minhas esferas
A boca que escarra na minha boca
(Ô mau hálito dus inferno!)
E a mão que balança o berço
É o desprezo gozado do teu terço
Que minha canção da prima-Vera
Possa te dar-te o cheiro da quimera.

(um mágico ia defecando pelos caminhos de meus im- testinos e plantou a raiz pútrica das certezas desavisadas pra que dimanhãzinha, quando o outro verme roer-me os óios, tu possas dizer do fogo que teve: caminhando e largando e medindo a combustão, somos todos inguais pênis eretos ou não.)

Oh, incandescência invulgar da minha indecência
Que queres apartar com tuas carnes penduradas?
Sai de mim, em nome do senhor!
Vá de reto, ó doce vampira vagabesca.
O cuspe que me tens é pouco quente
Na tua cara nasce na testa um vago dente.
E a serpente do Adão, aquele rapagão
Insiste em dar a curva e cravar-te o agulhão.

A métrica desperfeita

Um ovo quebrado é o mesmo dado
Ao lindo gado
Que bate com os burros n’acerca
E que vomita a cola amerelada das (h)oras e que não pára de gemer como um bebê,
Que não pára o fluxo hemorrágico da primeira veiz
De uma vaca.


A conta matématicazinha dos pulmões em-venenados pelos vícios do tábaco e do tráfico e do médico.

-Tens um enfizema enviesado
Que vai te custar um trocado.
-Arranca.
- Teu dente amarelado não suportaria.
- Espreme.
- Lá vai a força abrupta de minhas unhas! Ummmmmmmmmmmmmmmmmmmm!
- Ai!
- Doeu? Em mim, não!
- Caguei-me.
- Toma a conta de teu sascrifício.
- Toma o tiro, seu ladrão de mulherrrrr!
Bang! Bang! Bang!
E o çangre se esparrama pelo chão igual batatinha quando nasce.


A espera do filho que ia nascer

Abestado desinfeliz de çangre e pau
Fruto azul de magreza gotejante
Filho da puta véia debutante
De minha hercúlea trama teatral.

Que prazer ornitológico fatal
Com-sumiu com a energia de um meliante,
Em tua pobre vidinha de militante,
A minha ascendência ancestral?

Torção de minha ovínia substãncia
Em que privada irás recordar a infância
Violentamente afônico, a tremer?!

Ah! Possas tu parir, feto comprimido
Plastificadamente diluído
Na eternidade do não ter!


Eu ti amo

Eu ti amo d+
Ti amo tanto que meu pranto é primavera.
Eu ti amo, já ti disse, meu amor?
Ti amo mais que amo a minha mãe
Ti amo mais que amo a minha charrete
Ti amo mais que amo o meu zumbigo
E que o meu patinete.
Ah, eu ti amo. Te digo di novo.

E quando eu morrer quero que você ponha no meu túmulo a frase do Camões:
“Amar como eu ti amo,
ninguém jamais amará;
sofrendo constantemente
somente por ti amar”
Viu bem como ti amo?
- Apaga a porra da luz e vem dormir, ô mala!
- Mogoei, não ti amo mais.


Ulisses, de James Joyce.

Não li Ulisses e nem Joyce.
Não li Olavo e nem Bilac.
Não li Machado e nem Alencar de Assis.
Não li Júlio Antônio e nem Cleópatra.
Não li Káfka e nem Káfta
Não li Vinícius e nem Jobim
Não li Mateus e nem os saduceus.
Não li teus livros e nem os meus.
Ah, esse transplante de córneas que não chega!


De liberdade e prisão

A liberdade clandestina

Acorda menina, que tua mãe saiu.
Não queria torcer pepinos?
Então, acorda que jástão maduros.

A liberdade coristina

Espirra menina, que tua mãe saiu
Não queria cheirar meninos?
Então, espirra que jástão batidos.

A liberdade bemcretina

Morre menina, que tua mãe não liga
Não queria mudar o mundo?
Então, morre que os politicus jástão.

A liberdade beneditina

Levanta menina e anda, que tua mãe tá dando
Não queria ver o rosto santo?
Então, levanta que jástão escarrando.


Prisão clandestina

Não saia menino, que teu pai chegou
Não queria emborrachar o couro?
Então, não saia que jástão queimando.

Prisão coristina

Fique ai menino, que teu pai chegou
Não queria enrolar barbante?
Então, fique aí que jástão fumando.

Prisão bemcretina

Anime-se menino, que teu pai nem liga
Não queria alienar o mundo?
Então, anime-se que os discipulus jástão.

Prisão beneditina

Ajoelhe-se e ore, que teu pai tá fodendo
Não queria rir do rosto santo?
Então, ajoelhe-se e ore que jástão fazendo.


Santa Maria, Pinta e Nina

Trêiz moçoilas elegantes:
(Cobra, jacaré e elefante)
Estão esparramadas rua a-rriba
Na esperança de trêiz rapazes arfantes:
(veado, unicornio e rinocerante)
Santa Maria!
Que pinta!
- Nina, vem já pra dentro que isso não é vida!
- Mamãe vem já pra fora que papai muito demora!
- Nina vem já pra fora que isso que é lida!
- Mamãe vem já pra dentro que papai chegou agora!


Cesário dos Anjos

Oh, verme maldito que me rói
Rói mais um pouco da minha vida
Verme querido que me rói.
Oh, minha cidade mal-diçouvida!
Oh, minha casca rala de ferida
Que o rato nojento da putrefação
Levará ao Lusotupínico impuro
A dor da eterna podridão.


O mistério do moço


Há trêiz coisas misteriosas entre o céu e a pedra:
A premeira é çaber por quem os sinos dobram.
A segunda é ssaber como dobrar um sino.
E a terceira é entender a importância desta operação.

Sim, porque não há de ser fássil imprimir força
De tal maneira que se poça curvar um padre.
Até porque não se curva um padre c’um pedido
Mas sim c’uma ordem do padre superior.

Da mesma forma o sino, que é o badalo do padre,
Não se dobra facilmente a um sorriso vago
Há de se ter boa estampa e vintém para tanto
Afinal a casa do padre, morada do sino, rói.

Por tanto o segredo, seu moço, do sino
É bater pra dizer ketábein vivo
E não sucumbir a ruína das torres fálicas
Onde os meninos badalam com o badalo do padre.

terça-feira, 6 de julho de 2010

AFORISMOS – FERNANDO CASAES

“Em toda perfeição, há em si pouquíssimas possibilidades”


“É muitas vezes no abandono que descobrimos a beleza de estar só!”


“Ninguém é verdadeiramente dono do próprio nariz, a não ser que habite num mundo totalmente isolado de tudo e de todos, pois quaisquer que sejam nossas decisões, mesmo as mais aparentemente individuais, envolvem direta ou indiretamente outras pessoas, portanto, embora tenhamos o livre arbítrio, nossas escolhas estão recheadas de informações e de dívidas para com o próximo.”


“Não tomamos decisões baseados em intuições; antes, somos levados a tomar pelas circunstâncias. As vozes que existem dentro de nós, que são as referências, nos impelem a decidir. Somos apenas os instrumentos de declaração de uma vontade que pertence a um todo construído dentro de nós.”


“Só nós mesmos somos responsáveis pelo que nos trás felicidade, na medida em que podemos estar dispostos ou não a determinadas ações do outro nesse sentido.”


"Deus, criador do céu e da terra, de tudo e de todos, criou o homem à Sua imagem e semelhança; este, por sua vez, réplica de Deus, criou Deus."


“Tolice dizer que aprendemos mais com a tempestade do que com a bonança, afinal, o aprendizado se dá em melhor conta com observações distanciadas de nós mesmos e de tudo ao largo, observações estas que exigem contemplação, ao contrário da utilização mecânica das experiências pessoais; estas nos fazem decidir, muitas vezes no pulo, enquanto que as outras nos fazem precisar.”


“Muito menos me vale um ponto de vista, visão ególatra; prefiro a vista de um ponto, algo mais participativo.”


“Chamaram-me ‘niilista’. Niilista eu sou, mas como tal, não estou bem certo se minha posição é absoluta. Melhor acreditar que minhas verdades morais se sustentam no vácuo.”


“Muita vez temos um pai e não temos nele um amigo, assim como a um filho que nos detém amizade ou ainda um irmão, que mesmo consanguíneo, não nos é afeiçoado. Já o amigo nós é tudo isso: Pai, filho, irmão... A amizade é a mais incisiva manifestação do amor.”


"Notícia ruim só chega primeiro quando quem a trás adora desfrutar de uma boa conversa fiada. Este tem mais interesse no assunto, para exercer sua tagarelagem, do que acudir propriamente àquele que foi noticiado."


"A morte nada mais é do que um banquete de vermes. Nada além disso."


"Perguntaram-me: 'Acreditas em alma?' Respondi: 'Só as que povoam as composições poéticas.'


"Já me angustiou muito o pós-vida; hoje me angustia mais a não-vida."

"Ao que maltrata ou ignora os animais um aviso: a dor que causas ao ser que não pode expressar-se verbalmente e, muita vez, defender-se, é proporcional à dor que sentes em tua alma. A dor do abandono de ti mesmo. Assim, antes de amaldiçoar as criaturinhas, expulsa de dentro do teu coração os fantasmas de tua repugnância. Sê feliz ao lado de um cão. Ele ser-te-á fiel e tu perceberás que, em verdade, é o animal não-humano o mais inofensivo e amoroso dos seres."

"A fragilidade feminina deve habitar o campo das aparências e nunca o das possibilidades..."

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Um Jovem amigo, de 15 anos, propôs-me uma questão: “É verdade que a música Back in Black do AC/DC é uma atrofia de Stairway to Heaven do Led Zeppelin?”
Eis minha resposta:

Caro Gustavo,

É um prazer poder tentar te ajudar na questão Back in Black do AC/DC versus Stairway to Heaven Led Zeppelin, no que tange a possibilidade do que você chamou de “atrofia” da primeira em relação à segunda.

Bem, primeiro vamos tentar entender o que é “atrofia” e se esta palavra pode ser usada na música, ok? Não vou citar, por motivos óbvios, o uso desta em questões médicas-físicas; mas há ainda o sentido figurado, e aí temos: Definhamento, degenerescência, decadência.

Querido novo amigo, parece que está claro, pela interpretação figurada da palavra “atrofia” que sua proposição não é correta. Não há uma relação de “definhamento” de uma música em relação à outra. Talvez você pretendesse usar a palavra “contração”, que quer dizer, entre outras coisas, o seguinte: Ato ou efeito de contrair (-se), encolhimento, diminuição, encurtamento. Em sendo esta a palavra substituta à “atrofia”, poderíamos pensar que sim; uma composição pode por várias questões, tais como: estéticas, sociológicas, mercadológicas, filosóficas, históricas, folclóricas, etc, “contrair” outra composição. Ocorre que, comparando-se as duas composições propostas, não há contração da primeira em relação à segunda.

Passemos, portanto, à outra questão: Mas há alguma relação entre elas? Vamos lá: Nas artes, como na vida, nada se cria, nada é genuíno. Tudo que há são observações acerca do mundo e suas possibilidades. São adaptações ou, melhor, nossas conclusões a respeito disto ou daquilo. Quando compomos – para ficarmos no mundo da música – não criamos absolutamente nada de genuíno, somos um somatório de influências, de aprendizados, de gostos, de referências. Então, poderia sim ser uma composição fruto da inspiração da outra.

Apenas poderia, porque não podemos precisar, já que não as compomos. E muitos morreriam negando até o fim que não se inspiraram neste ou naquele outro. Mas na música, tal qual na literatura, duas formas aparentemente distintas de artes, o traço de “inspiração” é mais facilmente detectável. Numa abordagem livre, eu diria que sim, a música do AC/DC indica, veja bem, indica uma “inspiração” na música do Led Zeppelin. Em literatura há um termo muito comum: “intertextualidade”, que quer dizer, grosso modo, a confecção de um texto com referências claras de outro ou outros dentro dele.

Seria possível a “intertextualidade” nas canções? Sim. Há muitos exemplos por aí... É então o que acontece em sua proposição acima? Não. Definitivamente, não. Mas há fragmentos de “interface”, ou seja, um conjunto de elementos comuns entre duas ou mais áreas de conhecimento, de interesse, etc. A canção do AC/DC parece “dialogar” mesmo que às avessas, com a canção predecessora de Led Zeppelin, canção esta que, segundo os críticos, só mesmo os dois autores da música, Jimmy Page e Robert Plant, seriam capazes de explicar o significado de uma letra tão complexa. E eu concordo! Toda e qualquer tentativa de interpretação da letra de “Stairway...” cairá no mar amplo das cogitações.

Mas do que falam as canções? Que interface poderá existir? Vejamos as letras em livre tradução para o português:

Entre parênteses, minha leitura do(s) verso(s)


Escada para o Céu (Stairway to Heaven)

Há uma mulher que tem certeza [que]
Tudo que reluz é ouro,
E ela está comprando uma escada para o Céu...(ela = morte? A morte parece oferecer uma “saída” para o céu em antagonismo com o inferno)
Quando ela chegar lá, ela sabe [que]
Se as lojas estiverem todas fechadas,
Com uma palavra ela pode conseguir aquilo pelo que veio.
E ela está comprando uma escada para o Céu...

Existe um sinal na parede
Mas ela quer ter certeza,
Pois você sabe, às vezes as palavras têm dois sentidos. (O que é céu e o que é inferno? Juízo de valores? “Você, que me escuta, sabe a diferença?”)
Numa árvore perto do riacho
Tem um pássaro canoro que canta,
Às vezes, todas os nossos pensamentos estão apreensivos.
Ooh, isso me faz pensar,
Ooh, isso me faz pensar...

Tem uma sensação que sinto
Quando olho para o oeste
E meu espírito está implorando para ir embora (a morte como alternativa)
Em meus pensamentos eu tenho visto
Anéis de fumaça através das árvores
E as vozes daqueles que permanecem olhando.
Ooh, isso me faz pensar,
Ooh, isso realmente me faz pensar...

E foi sussurrado que em breve,
Se nós todos invocarmos a melodia,
Então o flautista nos conduzirá até a razão. (Se aceitarmos as regras, seremos salvos pelo flautista (Deus?))
E um novo dia vai amanhecer (a redenção)
Para aqueles que resistem há muito tempo,
E as florestas vão ecoar com risos...

Se tem um tumulto na sua cerca
Não fique alarmado agora,
É apenas uma limpeza de primavera para a rainha de Maio.
Sim, existem dois caminhos que você pode seguir,
Mas no final das contas,
Ainda há tempo para mudar a estrada em que você está. (o livre arbítrio)
E isso me faz pensar...

Sua cabeça está zunindo e não vai passar,
No caso de você não saber
O flautista está te chamando para juntar-se a ele.(flautista = Deus ?)
Querida dama, você consegue ouvir o vento soprar? (dama = vida)
E você sabia [que]
Sua escada jaz no vento murmurante? (a vida esvai-se)

E enquanto nós damos voltas descendo pela rua,
Nossas sombras mais altas que nossas almas,
Por lá caminha uma mulher que nós todos conhecemos,
Que brilha com luz clara e quer mostrar
Como tudo ainda transforma-se em ouro. (a lua (mulher com luz clara) “transforma-se” em ouro (sol) Transmutação entre a noite e o dia. O escuro pode se tornar claro. As trevas podem se tornar o paraíso.)
E se você prestar atenção muito atentamente,
A melodia chegará até você finalmente. (Você será “convencido”)
Quando todos serão um e um será tudo, (a unidade de Deus)
Para ser uma pedra e não rolar. (a imobilidade como resultado final. Aqui a marca do deboche.)

E ela está comprando uma escada para o Céu...(e ela “ainda” quer me convencer de que lá é melhor.)


De Volta ao Preto (Back in Black)

Eu fui dormir
Estive longe por muito tempo (estive ausente, morto para o mundo)
Estou contente por estar de volta, sim (mas agora estou de volta à vida e feliz.)
Estou me libertando do nó corrediço
Que me manteve pendurado até agora
Continuo olhando para o céu (uma possibilidade distante e
Porque isto está me animando com um novo sentido)
Esqueça o carro fúnebre
Pois nunca morrerei (o apego à vida, a recusa em morrer.)
Tenho nove vidas, olhos de gato
Maltratando cada um deles e correndo selvagemente

Porque eu estou de volta (Voltei à vida)
Sim, eu estou de volta
Bem, eu estou de volta
Sim, estou de volta
Bem, eu estou de volta, de volta
Eu estou de volta de preto
Sim, de volta de preto (votei à vida, mas ainda trago a morte, o luto.)


De volta num banco de trás de um Cadillac
Número um com uma bala
Sou um pacote de poder
Sim, eu estou numa peleja com a banda
Eles terão que me pegar se quiserem me pendurar
Porque eu estou outra vez seguindo o rastro
Estou combatendo o fogo aéreo
Ninguém vai me pegar em outra armadilha
Então olhe para mim agora
Estou apenas fazendo meu jogo
Não tente forçar sua sorte
Simplesmente saia do meu caminho (Morte, não me venha agora. Quero viver. Não se imponha a mim. Eu te rejeito.)

Porque eu estou de volta (voltei a viver)
Sim, eu estou de volta
Bem, eu estou de volta
Sim, estou de volta
Bem, eu estou de volta, de volta
Eu estou de volta de preto
Sim, de volta de preto

Longe de vista!!


Bem, Gustavo, está bem clara a interface, não é mesmo? Uma canção, a do Led Zeppelin fala de “alguém” que sente o impulso pela morte e “namora” com esta possibilidade usando metáforas como “Deus Flautista” ou “lua e sol” e ainda questões filosóficas e religiosas para servirem de argumentos ao seu aparente impulso que o levará às escadas que se apresentam para o paraíso. Mas ao terminar, tudo nos leva a crer que ele, o “alguém”, na verdade não pensava em morrer e que estava o tempo todo debochando dessa possibilidade, já que a morte significaria, dentro de todos os juízos colocados, a imobilidade perene. Ele diz textualmente que morrer não é ser livre, é encontrar no “paraíso” (ou no inferno) um “deus” que na verdade é de pedra. A canção nega a morte como sendo redentora. Como aproximação de algo divino. Fantástico, não é mesmo? Filosofia pura na veia!

Já na canção do AC/DC a coisa rola um pouco na contramão. Alguém que estando “morto” quer voltar a viver. Apega-se às novas oportunidades que a vida pode proporcionar. E ele rejeita severamente a morte, mesmo se recusando a abandonar o preto como sua cor, afinal, ele voltou e está feliz. É uma canção muito mais simples, quase nada mesmo de metáforas, até certo ponto, pobre em comparação à anterior, mas que como interface a uni-las, a questão da morte e a negação às coisas naturais, enquanto ordens.

Volto a lembrar que minha leitura é livre e não é, por isso mesmo, detentora de qualquer “verdade”; mesmo porque, se houver uma verdade legítima na interpretação das letras acima, ela de certo pertence aos seus autores.

Gustavo, alonguei-me muito, não é mesmo? Mas o seu questionamento, embora pudesse não parecer, foi interessante e inteligente e, penso, merecia uma resposta razoável.

Forte abraço, amigão!

Fernando Casaes

quinta-feira, 20 de maio de 2010

O crítico e a poeta

À crítica não cabe emoção. Há de se ter absoluto distanciamento do objeto a ser analisado para efeito de formulação de crítica. Pois bem, assim deve ser a coisa; ou deveria ser... Diariamente sou confrontado com alguns textos, quer sejam jornalísticos, literais ou informativos, mas o bichinho que habita em mim, o bichinho que lê procurando os contornos, as nuances do texto, esse sempre acha aqui e ali o quê criticar. Já há em mim esse movimento compulsivo de ler não sou com os olhos despreocupados, mas antes com os olhos inquisidores de quem procura um único motivo para condenar. A crítica não condena e nem absolve; a crítica comenta, confabula, argumenta, compara, expõe, propõe, erra, acerta... Eu olho já buscando o peso do cárcere. Estou aprendendo ainda. Há muito de minha personalidade autoritária e nem um pouco complacente na minha crítica literária. Estou errado, assumo... Mas ao menos já sei disso e buscar o distanciamento devido e desejado é muito mais fácil quando já sabemos de onde partir.

Quando por ventura dou com os olhos em algum texto que desperta vivamente minha atenção, seja pelas imperfeições, seja pelas qualidades estéticas, sinto-me realizado. Pago a conta das horas que passei a folhear páginas e páginas de textos de todas as formas e origens. Nas imperfeições busco as tessituras que seriam adequadas na minha nada humilde opinião. É como reconstruir, tijolo por tijolo, uma casa erguida no universo das boas intenções, mas disforme pela ausência de capacitação de seu construtor. É muito bom achar textos assim, tão ruins que chegam a dar prazer só comparável ao gozo de uma relação. Porque reconstruir, mesmo que à parte, mesmo que oficiosamente, mesmo que secretamente em um pedaço de papel que ficará seguramente esquecido na gaveta, preenche meu pequeno grande ego.

E o que é o crítico afinal se não o cara que se coloca além do bem e do mal e pode tudo porque é dele o papel da crítica. Ele veio para aplaudir ou destruir e por mais que reneguem, na verdade, todos esperam seu veredito para depois enaltecê-lo como grande crítico ou achincalhá-lo como pedante e coisas do gênero. É duro o ofício. Mas e daí? É o jogo que deve ser jogado.

Acontece também o encontro com textos deliciosamente adequados. Textos que, ao contrário dos que pedem reconstrução cuidadosa, estão absolutamente prontos para serem saboreados pelas retinas dos mais variados públicos. Aí também tenho orgasmos, porque ao procurar as imperfeições e encontrar novas proposições estéticas ou mesmo que as usuais, novas leituras, travo um combate voraz com esses textos, torno-me mais rigoroso quando percebo que o texto é bom e ao me aprofundar na análise à procura de um senãozinho, mais me encanto, mais me sublimo, mais me rendo àquelas linhas. Adoro ser derrotado por um bom texto. E assim se deu com a poesia de Mariana Arnoso. Mesmo já tendo retocado aqui e ali, mesmo tendo ganhado algumas batalhas, ainda assim, a beleza juvenil, a leveza, o descompromisso, a linguagem atual e atuante e, mais do que tudo, as inovações estilísticas, me derrotam a cada nova leitura. É um jogo que marco um tento aqui, outro ali; digo: “Aqui ela errou a mão”, mas que ao final, saio do estádio com uma sonora goleada pelas ventas.

É quando a emoção toma a veia fria do crítico. Quando leio a poesia de Arnoso, penso na expressão do rosto dela, em suas mãos rabiscando o papel, buscando um novo efeito. Penso no seu sorriso furtado de um querubim, nas suas inseguranças de uma quase-menina, nos desconsertos já alardeados por ela sobre a sua vida, no seu andar jogado, passos trôpegos, indecisos... Não há como não falar a emoção. Por mais que eu busque o distanciamento, por mais que eu almeje a isenção crítica, por mais que eu diga: “Mariana, entre nós, só arte!”, ainda assim ao deliciar-me com sua poesia, não consigo apartar de mim a Mariana; a Mariana que habita em Mariana Arnoso, a poeta. Quero muito que ela vença, indico o caminho, aponto possibilidades, quase me projeto na sua obra, mas muito nessas horas não é o crítico quem fala, mas o homem por detrás do crítico. E não se separa um do outro. Quando isso se dá, a crítica perde a função. Perde mesmo a sua identidade. Corro esse risco. Sempre acho que no final conseguirei retomar a idéia original e buscar o foco. Mariana Arnoso, a poeta, merece e merece muito que minha crítica e somente ela, fale por mim. Depois, quem sabe, poderei pretender ter de Mariana, a mulher, uma poesia só para mim. Um olhar mais aprofundado dessa que é, antes de ser uma mulher linda e extraordinária, uma poeta bem acima da média em sua produção artística. O tempo dirá se estou certo ou errado. Se agi com independência ou se já os transtornos do desejo falaram por mim. De qualquer forma, em Mariana, o meu lado é o lado dela. Minha rua é a rua dela. Minha praia é a mesma praia dela. Não pego onda como ela, mas não ficaria tão mal sentado na areia apreciando o pôr do sol enquanto Mariana desliza carregada de poesia pelas espumas dos mares do sul.